07/11/2013

O PRIMEIRO AMOR


Tenho 39 anos. E ainda me lembro do meu primeiro amor. Corria o longínquo ano de 1980. Tinha eu 5 anos. Andava na pré-primária. E tinha uma colega que parecia um anjo enviado para iluminar o mundo. Chamava-se Nancy. Sim sim, como a boneca. Parece mentira mas é verdade. Cabelos longos e louros. Tão brilhantes que era como se o sol estivesse sempre a brilhar nela. Olhos azuis cristalinos. Olhar-lhe nos olhos era mergulhar na lagoa azul. Cada vez que ela passava à minha frente, todo o som à minha volta era anulado. Só ouvia rouxinóis e canários numa manhã de sol. Tudo ficava em câmara lenta. E aquele perfume a Johnson & Johnson e a pó de talco que ficava a pairar no ar deixava-me em transe. Era um anjo a Nancy. Mas não me passava cartucho nenhum.

Um dia a turma foi toda num passeio escolar a um parque. Brincávamos todos no relvado imenso quando encontro uma flor no meio da relva. Era um malmequer. A única flor no meio daquela relva toda. Apanhei-a. As meninas andavam a brincar às princesas ou lá o que é que elas brincavam, quando duas me viram com a flor na mão. A Nancy e a Tânia. Vieram a correr ter comigo. A Nancy parecia uma das miúdas da Casa na Pradaria  a correr pelo campo em slow motion. A mesma música e tudo. A Tânia parecia mais o Tom Sawyer. Chegaram ao pé de mim e as duas pediram-me a flor.
Aqui começa o dilema. A Nancy, o anjo louro com olhos de diamante, o meu "primeiro amor". Pediu-me a flor. "É para eu pôr no cabelo" disse ela com uma voz que parecia acompanhada de harpas tocadas por outros anjos. A Tânia, uma menina comum, até a puxar um bocadinho para o feiinho, meio rapazola, também me pediu a flôr. "É para eu ser princesa" disse ela com voz de bagaço.
Meio perdido fico ali parado com a flor na mão a olhar ora para uma, ora para outra, sem saber muito bem o que fazer.

A Nancy, percebendo a minha hesitação, diz "eu dou-te um beijinho pela flor" enquanto rodava o seu lindo vestido branco folhado, joelinhos ligeiramente metidos para dentro. Sacanita. Perecbeu que eu embeiçava por ela e já estava a usar todo o seu charme para conseguir o que queria.

A Tânia, menina simplória e introvertida, pouco dada a essas coisas do charme e do encanto, mete a mão ao bolso das suas jardineiras cagadas, e tira um sapo em miniatura de brincar. Diz-me "eu dou-te o meu sapo pela flor".

Xiiiiiii. Situação do caraças. Sabem o que eu fiz? Difícil esta decisão né? Pois é. Um puto com 5 anos já a passar por um dilema destes. Caramba. Um dia conto-vos o que fiz.

Para já, e enquanto via o meu filho sentadinho com a Melissa que ele tinha acabado de conhecer sozinho, pensei para mim "aí está. a primeira paixão dele. o que uma mulher é capaz de fazer. olha pra ele ali sossegado. nada o faz sentar assim sossegadito. só a Melissa. e o Toy Story 3."

Filho, só espero que sejas tão feliz como eu no amor. Porque o primeiro amor é giro. Dá para escrever histórias em blogs e tal. Mas o maior amor ainda está para vir. Vai te fazer sorrir sem parar e vai te fazer doer como tudo. Mas vai valer a pena. E quem sabe. Até pode vir a ser a Melissa. Porque esta vida dá voltas do caraças.

10 comentários:

  1. Já agora, e porque sou curiosa, posso saber como resolveu o dilema beijinho vs sapo?

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    1. claro que sim Teresa. Troquei a flor pelo sapo. Assim a menina "feiita" sentiu-se uma princesa e a menina-anjo aprendeu que nem tudo na vida se consegue só com charme. mas na altura o que eu queria mesmo era o sapo. afinal tinha 5 anos, e beijinhos não estavam no topo das minhas prioridades. :)

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  2. Passei por acaso e gostei...marquei lugar para voltar!
    Bom dia
    Maria

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Gosto mesmo da forma como escreves :)

    http://asasdepapel-inesramos.blogspot.pt/

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